terça-feira, 13 de novembro de 2007

QUE BOM QUE SOMOS TANTOS OS INDIGNADOS

De: Pedro Porfírio
Para: Edson Nogueira Paim
Data: 11/11/07 20:42
Assunto: QUE BOM QUE SOMOS TANTOS OS INDIGNADOS



MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 13 DE NOVEMBRO DE 2007


http://www.tribunadaimprensa.com.br/porfirio.asp

"Nada poderia prejudicar um homem a não ser ele próprio. Nada poderia lesá-lo. O que um homem realmente tem é o que está nele. O que está fora dele deveria ser coisa sem importância".

Oscar Wide, escritor irlandês (1854-1900)

Com aviso prévio por conta da queda de sua audiência, Howard Beale, um veterano âncora de um programa de TV dos EUA, anuncia no ar o seu suicídio. Com o impacto da notícia, volta a despertar o interesse dos telespectadores e, apoiado por uma ambiciosa produtora, passa a exibir desabafos cada vez mais pungentes até o dia em que leva nos norte-americanos a uma manifestação de indignação coletiva.

Essa é a essência do filme "Rede de Intrigas" (Network), o mais premiado dos Estados Unidos em 1976, um ano depois do fim da funesta guerra do Vietnã, em que 54 mil soldados norte-americanos morreram, milhares voltaram mutilados e outros tantos, viciados em drogas. Isso sem falar na "culpa" pelas mortes de 2 milhões de vietnamitas.

O filme não tinha nada a ver com o desastre que levou milhões de jovens e pacifistas a todo tipo de protesto, incluindo a queima de documentos de reservistas e o aparecimento do movimento "hippie" e uma geração desencantada.

Mas preenchia o grande vazio que a perplexidade operou sobre o existencial dos norte-americanos. Decididamente, 1976 chegou como o ano da verdade, da desmistificação dos mitos de guerra colonial, afetando na veia o próprio "american way of life". O filme de explosões catárticas veio a calhar, sob medida.

O seqüestro do raciocínio

Essa lembrança me veio a partir da repercussão da minha última coluna sobre o seqüestro do raciocínio e o apagão da inteligência, armazenada em www.palanquelivre.com. Jamais esperei receber comentários tão profundos e, para ser honesto, tão compensadores.

Há muito venho observando preocupado o comportamento da sociedade humana e, por estar no centro de um furacão, me pergunto se terei forças e paciência para assimilar o que minha percepção acusa.

Sou hoje um homem de 64 anos, que percorreu uma longa e tortuosa caminhada, desde as calças curtas. Sou pai, avô e, o que me toca mais agudamente, sou pai-avô de dois adolescentes para os quais não tenho certeza de que haverá porto seguro no amanhã turvado.

Pode até ser que me influencie uma certa paranóia da idade, mas a crônica tétrica do nosso cotidiano e a leviandade com que os senhores do mundo agem parecem mais salientes na tortura do meu cérebro nervoso.

Uma médica da Bahia escreveu textualmente: "Recebi este texto de um caro amigo aqui da minha terra ( Salvador- Bahia) e gostei tanto que fui pesquisar como poderia agradecer, brindar, celebrar Pedro Porfírio por este texto. Digo especificamente este texto porque traduz exatamente aquilo que penso, ao ponto de crer que ele seqüestrou o meu raciocínio e o pôs em palavras!"

Como ela, um bom número de leitores, alguns me escrevendo pela primeira vez, demonstraram com todas as letras que participam do mesmo sentimento que me levou àquelas linhas. Esse sentimento tem um nome: INDIGNAÇÃO.

Em nenhum momento, pretendi mais do que externar o que vinha ao mesmo tempo do meu cérebro e do meu coração. Mas a constatação de que uma perigosa anemia mental alastra-se como uma epidemia que desfigura e amesquinha as personalidades teve o efeito de um choque, ao ponto de receber a seguinte mensagem: "Nunca nos tempos atuais li um texto tão correto, tão verdadeiro e por isso mesmo, infelizmente, tão triste".

O não pensar como rotina

Muitos falaram de suas próprias vivências. Uma professora da Universidade de Pernambuco, de quem de vez em quando recebo consistentes opiniões, observou: "Mais uma vez você acertou na mosca. Infelizmente... Uma das coisas que mais me angustiava, quando ainda estava dando aulas, era a incapacidade de raciocínio que impregnava os alunos. Com algumas raríssimas e honrosas exceções, a maioria se abastardava no exercício do não-pensar. As coisas mais primárias pareciam inacessíveis para os alunos e tudo porque não exerciam a capacidade do raciocínio. Entretanto, justiça seja feita, a culpa não era deles, em grande parte".

Outro interlocutor, de São Paulo, depois de uma profunda análise da realidade, sugeriu: "não deixe morrer esse assunto e repita esse artigo em todos os sites que têm seu nome. Não é simples escrito da coluna do Pedro Porfírio, é um sinal de alerta capaz de fazer funcionar mentes adormecidas. É muito oportuno, cheio de verdades e chama os cidadãos brasileiros à razão".

Muitos comentários são de pessoas que provavelmente não concordam com muitas de minhas opiniões. Mas, nesse caso, parece que houve uma convergência, até porque, como disse, há de nos aproximar a busca decente de uma verdade que sirva de referência. Essa verdade tem de ter por escopo da honestidade de propósitos e a raiz no respeito que nos devemos mutuamente.

Assim, disse muito quem escreveu: "Tenho que te cumprimentar pela verticalidade zenital da tua matéria", Ou, partícipe das mesmas preocupações e no convívio mais próximo, não conteve sua emocionada manifestação: "Seus artigos são infinitamente bons. Mas neste você se superou. Orgulho-me de existir pelo menos um vereador em minha cidade que pense assim. Orgulho-me de ter pelo menos mais um cidadão em minha cidade que pense assim. Parabéns é pouco, mais é o que eu lhe posso passar".

Foram muitas e significativas as opiniões. Posso deixar de citar todas, pelo espaço, mas insisto em que essa reação demonstra que, apesar da inércia fabricada nos laboratórios de um sistema inescrupuloso, ainda há seres que não renunciaram ao direito à indignação. Veja mais:

"Perfeito! Infelizmente, parece que o povo brasileiro - a faixa pensante - está paralisado".

"Parabéns pela definição terceirizar o cérebro. Excelente por ser muito acertada e mais precisa do que a própria precisão".

"Sem Educação, não se forma consciência crítica e os resultados da alienação e ignorância respondem pelo amontoado de disparates que nos sufocam como país. Não há ideologia que prevaleça, nem à direita à esquerda ou no meio".

"Irretocável. Nada mais há a ser dito".

Sinceramente, tantos e tão tocantes comentários me fazem sentir uma grande responsabilidade. Há muito mais o que escrever para além do cotidiano virtualmente programado, onde uma máquina mortífera oferece diariamente à distinta platéia uma sopa de truques, mágicas, mentiras e ilusões. É o que penso fazer, com a sua cumplicidade.

coluna@pedroporfirio.com

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