terça-feira, 27 de novembro de 2007

QUANDO A SEMÂNTICA MANIPULA O JOGO DO PODER

De: Pedro Porfírio
Para: Edson Nogueira Paim
Data: 25/11/07 22:06
Assunto: QUANDO A SEMÂNTICA MANIPULA O JOGO DO PODER




MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 26 DE NOVEMBRO DE 2007


http://www.tribuna.inf.br/porfirio.asp

"Quando o escravo era acorrentado com grilhões de ferro era fácil perceber a escravidão. Quando agora desfila acorrentado a algemas semânticas torna-se difícil, ao espírito acrítico, perceber a escravidão do homem

"

Albert Camus, escritor franco-argelino (1913-1960)


Eleito, reeleito e com suas reformas constitucionais submetidas a referendos, ao contrário do que acontece no Brasil, o presidente Hugo Chávez é tratado como "ditador" num abuso de linguagem que poderá produzir efeitos contrários aos desejados por seus adversários, como aconteceu em Cuba.

Quando fui a Cuba pela primeira vez, em 1960, fazia um ano e meio que os guerrilheiros liderados por Fidel Castro haviam posto em fuga o ditador Fulgêncio Batista, no poder desde 12 de março de 1952, graças a um golpe militar.

Havia um clima de grande euforia com algumas medidas adotadas pela revolução, incluindo uma corajosa reforma agrária, nacionalizações de empresas estrangeiras e medidas sociais que beneficiaram os trabalhadores das cidades.

Os norte-americanos não estavam nada satisfeitos com o estilo dos revolucionários e partiram para as retaliações. Estabelecido o confronto, dispararam uma orquestrada guerra de propaganda, dizendo que aquelas mudanças tinham inspiração comunista.

Logo ao deixar o Aeroporto José Marti, deparei-me com um outdoor, assinado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Aviação, no qual se lia: "SE ESTO ES COMUNISMO, ENTONCES EL COMUNISMO ES BUENO".

Lembro desses fatos para propor uma conversa aos meus leitores, aos quais respeito, independente de suas paixões políticas ou ideológicas. Parto do princípio de que é pelo diálogo honesto que poderemos produzir um sentimento comum de olho no amanhã dos nossos filhos e netos.

Porque o hoje dos brasileiros infelizmente é de maus presságios. Eu me pergunto nas que futuro reservamos para essa juventude diante da constatação deprimente de que nem mesmo com o canudo tem-se a garantia de um espaço para prover a sobrevivência com dignidade.

Falsas verdades

Estou convencido de que o Brasil foi minado por anos de saques e desmandos, com a disseminação da idéia de que o Poder Público é uma mina de enriquecimento fácil e favorecimentos direcionados para quem tem mais bala na agulha, seja grego ou troiano.

E lamento que esse ambiente tenda a cristalizar-se pela força de idiossincrasias petrificadas, facilmente manipuladas pelo laboratório das falsas verdades, que introduz seu semem no útero de uma classe média perdida entre a insegurança social, a decadência econômica, o esfacelamento da família, a alienação cultural, a renúncia ao raciocínio crítico, o vício do arremedo, a inveja congênita, os dogmas atávicos e as paranóias introjetadas pelos meios de comunicação de massa.

Por causa disso, a sua visão dos acontecimentos é semelhante a de um torcedor de futebol. Em muitos casos, você não viu e não gostou. Em conseqüência, como a história nos demonstra, os triunfos de alguns são obras inconscientes dos seus oponentes.

Tomemos um exemplo: a questão dos mandatos.

Antes mesmo das primeiras eleições diretas para presidente, pós-64, o senhor José Sarney, que sequer havia sido eleito presidente mesmo no "colégio eleitoral", obteve da Assembléia Constituinte a prorrogação do seu mandato para cinco anos. Essa foi a mais grosseira violação da vontade popular. Mas a máquina de manipulação praticamente silenciou, deixando você achando que aquilo era inevitável.

Depois, foi a vez de Fernando Henrique aprovar a reeleição em causa própria. Fosse ética, a decisão só valeria para os presidentes seguintes. Mas a mesma máquina deu o "tratamento adequado" para favorecê-lo. Você viu tudo aquilo, os expedientes torpes, mas nada podia fazer. Ele foi reeleito em 1998 com maioria absoluta, mas perderia fatalmente em 2002, se tivesse direito a uma nova disputa.

O foco direcionado

Você esquece essas tramóias porque não aceita fazer a própria autocrítica. Viu que Sarney se atribuiu mais um ano no poder, embora não tivesse nenhuma legitimidade, até porque tinha sido o principal cúmplice civil da ditadura exaurida.

Uma ditadura sui generis, aliás, em especial na questão dos mandatos: ao contrário de outros regimes castrenses, no do Brasil não podia haver "reeleição" dos generais, que se revezavam segundo a correlação de forças nos quartéis.

A guerra semântica de hoje leva a mesma máquina de fabricar idiotas a taxar de ditador um líder eleito e reeleito pelo povo, cujas mudanças constitucionais - ao contrário das nossas - são submetidas a referendos com imprensa livre, em sua grande maioria hostil a ele. E lá as urnas eletrônicas são auditáveis, ao contrário das nossas, porque o voto também é impresso, como queria Brizola.

Como você acha que o exemplo pode ser seguido por aqui, fica logo com o pé atrás. Não passa pelo seu raciocínio que podem mudar os presidentes e permanecerem os mesmos donos do poder. Aliás, no essencial, mesmo com a alternância de partidos, não se pode dizer que o Brasil mudou.

Tenho uma opinião muito pensada a respeito dessa questão de reeleição. Se ela é admitida, tanto faz uma como dez, como era antigamente nos Estados Unidos até Roosevelt vencer quatro pleitos seguidos. E como é de fato nos regimes parlamentaristas.

E mais: o México está aí como exemplo - lá não pode haver reeleição nem para parlamentares e, no entanto, durante setenta anos, foi dominado em todos os níveis pelo PRI, partido que deu as cartas até exaurir-se em 2000.

Espero que você entenda: não é a possibilidade de reeleição que garante a permanência de um governante numa sociedade democrática. A menos que ele seja extremamente competente e não tenha adversários à altura, dificilmente resiste ao desgaste. Aí, para o grupo dominante, o melhor negócio é ter uma alternativa própria, mantendo o controle da máquina. Com isso garante o domínio de oligarquias que controlam o poder, independente de quem governe.

Isso você não vê, porque os grilhões da semântica o mantêm no limite da discussão programada.

A crise do gás

Nesta sexta-feira, dia 30, das 9h às 13 horas, a Câmara Municipal do Rio de Janeiro abrirá seu plenário para uma audiência pública sobre a crise do gás e as políticas energéticas.Estão convidadas as autoridades do setor ,distribuidores, varejistas e taxistas. Se você mora no Rio e quer discutir algo que vai repercutir no seu dia a dia, compareça e leve sua opinião.

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terça-feira, 13 de novembro de 2007

QUE BOM QUE SOMOS TANTOS OS INDIGNADOS

De: Pedro Porfírio
Para: Edson Nogueira Paim
Data: 11/11/07 20:42
Assunto: QUE BOM QUE SOMOS TANTOS OS INDIGNADOS



MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 13 DE NOVEMBRO DE 2007


http://www.tribunadaimprensa.com.br/porfirio.asp

"Nada poderia prejudicar um homem a não ser ele próprio. Nada poderia lesá-lo. O que um homem realmente tem é o que está nele. O que está fora dele deveria ser coisa sem importância".

Oscar Wide, escritor irlandês (1854-1900)

Com aviso prévio por conta da queda de sua audiência, Howard Beale, um veterano âncora de um programa de TV dos EUA, anuncia no ar o seu suicídio. Com o impacto da notícia, volta a despertar o interesse dos telespectadores e, apoiado por uma ambiciosa produtora, passa a exibir desabafos cada vez mais pungentes até o dia em que leva nos norte-americanos a uma manifestação de indignação coletiva.

Essa é a essência do filme "Rede de Intrigas" (Network), o mais premiado dos Estados Unidos em 1976, um ano depois do fim da funesta guerra do Vietnã, em que 54 mil soldados norte-americanos morreram, milhares voltaram mutilados e outros tantos, viciados em drogas. Isso sem falar na "culpa" pelas mortes de 2 milhões de vietnamitas.

O filme não tinha nada a ver com o desastre que levou milhões de jovens e pacifistas a todo tipo de protesto, incluindo a queima de documentos de reservistas e o aparecimento do movimento "hippie" e uma geração desencantada.

Mas preenchia o grande vazio que a perplexidade operou sobre o existencial dos norte-americanos. Decididamente, 1976 chegou como o ano da verdade, da desmistificação dos mitos de guerra colonial, afetando na veia o próprio "american way of life". O filme de explosões catárticas veio a calhar, sob medida.

O seqüestro do raciocínio

Essa lembrança me veio a partir da repercussão da minha última coluna sobre o seqüestro do raciocínio e o apagão da inteligência, armazenada em www.palanquelivre.com. Jamais esperei receber comentários tão profundos e, para ser honesto, tão compensadores.

Há muito venho observando preocupado o comportamento da sociedade humana e, por estar no centro de um furacão, me pergunto se terei forças e paciência para assimilar o que minha percepção acusa.

Sou hoje um homem de 64 anos, que percorreu uma longa e tortuosa caminhada, desde as calças curtas. Sou pai, avô e, o que me toca mais agudamente, sou pai-avô de dois adolescentes para os quais não tenho certeza de que haverá porto seguro no amanhã turvado.

Pode até ser que me influencie uma certa paranóia da idade, mas a crônica tétrica do nosso cotidiano e a leviandade com que os senhores do mundo agem parecem mais salientes na tortura do meu cérebro nervoso.

Uma médica da Bahia escreveu textualmente: "Recebi este texto de um caro amigo aqui da minha terra ( Salvador- Bahia) e gostei tanto que fui pesquisar como poderia agradecer, brindar, celebrar Pedro Porfírio por este texto. Digo especificamente este texto porque traduz exatamente aquilo que penso, ao ponto de crer que ele seqüestrou o meu raciocínio e o pôs em palavras!"

Como ela, um bom número de leitores, alguns me escrevendo pela primeira vez, demonstraram com todas as letras que participam do mesmo sentimento que me levou àquelas linhas. Esse sentimento tem um nome: INDIGNAÇÃO.

Em nenhum momento, pretendi mais do que externar o que vinha ao mesmo tempo do meu cérebro e do meu coração. Mas a constatação de que uma perigosa anemia mental alastra-se como uma epidemia que desfigura e amesquinha as personalidades teve o efeito de um choque, ao ponto de receber a seguinte mensagem: "Nunca nos tempos atuais li um texto tão correto, tão verdadeiro e por isso mesmo, infelizmente, tão triste".

O não pensar como rotina

Muitos falaram de suas próprias vivências. Uma professora da Universidade de Pernambuco, de quem de vez em quando recebo consistentes opiniões, observou: "Mais uma vez você acertou na mosca. Infelizmente... Uma das coisas que mais me angustiava, quando ainda estava dando aulas, era a incapacidade de raciocínio que impregnava os alunos. Com algumas raríssimas e honrosas exceções, a maioria se abastardava no exercício do não-pensar. As coisas mais primárias pareciam inacessíveis para os alunos e tudo porque não exerciam a capacidade do raciocínio. Entretanto, justiça seja feita, a culpa não era deles, em grande parte".

Outro interlocutor, de São Paulo, depois de uma profunda análise da realidade, sugeriu: "não deixe morrer esse assunto e repita esse artigo em todos os sites que têm seu nome. Não é simples escrito da coluna do Pedro Porfírio, é um sinal de alerta capaz de fazer funcionar mentes adormecidas. É muito oportuno, cheio de verdades e chama os cidadãos brasileiros à razão".

Muitos comentários são de pessoas que provavelmente não concordam com muitas de minhas opiniões. Mas, nesse caso, parece que houve uma convergência, até porque, como disse, há de nos aproximar a busca decente de uma verdade que sirva de referência. Essa verdade tem de ter por escopo da honestidade de propósitos e a raiz no respeito que nos devemos mutuamente.

Assim, disse muito quem escreveu: "Tenho que te cumprimentar pela verticalidade zenital da tua matéria", Ou, partícipe das mesmas preocupações e no convívio mais próximo, não conteve sua emocionada manifestação: "Seus artigos são infinitamente bons. Mas neste você se superou. Orgulho-me de existir pelo menos um vereador em minha cidade que pense assim. Orgulho-me de ter pelo menos mais um cidadão em minha cidade que pense assim. Parabéns é pouco, mais é o que eu lhe posso passar".

Foram muitas e significativas as opiniões. Posso deixar de citar todas, pelo espaço, mas insisto em que essa reação demonstra que, apesar da inércia fabricada nos laboratórios de um sistema inescrupuloso, ainda há seres que não renunciaram ao direito à indignação. Veja mais:

"Perfeito! Infelizmente, parece que o povo brasileiro - a faixa pensante - está paralisado".

"Parabéns pela definição terceirizar o cérebro. Excelente por ser muito acertada e mais precisa do que a própria precisão".

"Sem Educação, não se forma consciência crítica e os resultados da alienação e ignorância respondem pelo amontoado de disparates que nos sufocam como país. Não há ideologia que prevaleça, nem à direita à esquerda ou no meio".

"Irretocável. Nada mais há a ser dito".

Sinceramente, tantos e tão tocantes comentários me fazem sentir uma grande responsabilidade. Há muito mais o que escrever para além do cotidiano virtualmente programado, onde uma máquina mortífera oferece diariamente à distinta platéia uma sopa de truques, mágicas, mentiras e ilusões. É o que penso fazer, com a sua cumplicidade.

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LEIA TAMBÉM

Um Estado perdido nas comunidades

MINHA COLUNA NO JORNAL POVO DO RIO DE 12 DE NOVEMBRO DE 2007

Se o governador quer mesmo enfrentar a violência, não pode abandonar os cidadãos que vivem em comunidades, que passaram a ser vistas como guetos suspeitos, para os quais o Estado só tem uma mão, a da polícia. Agindo assim, com essa cabeça, o governador não vai nos proporcionar nenhuma segurança e ainda terá que investir em novos cemitérios.

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sábado, 10 de novembro de 2007

O SEQUESTRO DO RACIOCÍNIO E O APAGÃO DA INTELIGÊNCIA

De: Pedro Porfírio
Para: Edson Nogueira Paim
Data: 08/11/07 22:17
Assunto: O SEQUESTRO DO RACIOCÍNIO E O APAGÃO DA INTELIGÊNCIA



MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 9 DE NOVEMBRO DE 2007

http://www.tribunadaimprensa.com.br/porfirio.asp

"Jamais aceite como exata coisa alguma que não se conheça à evidência como tal, evitando a precipitação e a precaução, só fazendo o espírito aceitar aquilo, claro e distinto, sobre o que não pairam dúvidas".

René Descartes, filósofo francês (1596-1650)

Nos dias de hoje, nada me assusta, deprime e revolta tanto como o seqüestro do raciocínio. Nada é mais danoso e demolidor. Nada causa tantos males à espécie humana.

Não. Eu não estou falando da corrupção da consciência. Nem da corrosão do caráter. Nem da desfiguração do sentimento. Não me refiro à extinção dos valores morais, éticos e religiosos que um dia pesaram nas atitudes.

Isso o dilúvio da hipocrisia em cascata afogou em sua devastação fulminante. Há sobreviventes que ainda respeitam esses valores jurássicos, admito. Mas são espécies raras, em ostensivo processo de extinção.

O raciocínio seria a última arma da natureza humana. Seria uma ferramenta disponível como uma bússola norteadora. Você podia ter sido amputado de valores tornados subjetivos. Poderia estar inoculado do vício do mais abjeto e desesperado individualismo.

Mas, ao dispor da capacidade de raciocinar, de pensar, respeitaria um novo tipo de cânone, amparado no instinto da sobrevivência. Não importava seu juízo de valores. Mas o cérebro falava mais alto na formulação do comportamento.

Não era o ideal. Antes, a solitária sobrevivência da capacidade de raciocinar se constituía num certo recurso do pragmatismo. Na busca do êxito, o raciocínio pode destituir-se de todo e qualquer constrangimento. Mas, pelo menos, é um elemento de avaliação. Que pode ser usado para o mal, mas também para o bem.

Um certo lamento

Para variar, você pode estar cismando sobre a própria natureza da nossa conversa de hoje. Tantos e tão graves acontecimentos estão ocupando as páginas dos jornais. E, no entanto, cá estou eu empacado na mais recente descoberta: seqüestraram o raciocínio.

É verdade. Eu bem que pensei em escrever sobre o mais novo desastre aéreo - o avc que paralisou a jovem BRA, subtraindo mais 1100 empregos diretos e uma generalizada desconfiança sobre o futuro da aviação comercial brasileira, submetido a um vôo cego que, logo,logo nos levará ao convívio com o inglês nas rotas domésticas.

Queria, sim, confesso, repetir pela milésima vez: a desarticulação da VARIG foi apenas o ponto de partida de uma aventura de notas marcadas. Com o golpe que pôs no chão a mais completa companhia aérea brasileira, o desmonte de todas as empresas do ramo será inevitável, abrindo um filão suculento para a internacionalização do nosso espaço aéreo. Ou você acha que o duopólio vai segurar o tranco?

Queria comentar essa tragédia anunciada, mas a necessidade de falar dos elementos essenciais que levam a esse e a tantos outros desastres me impõe o lamento da falta de raciocínio que assola o país.

Não importa se você é grego, troiano ou não faz parte das guerras e das torcidas apaixonadas. Você pode achar que é o que achar que é, mas não pode abrir mão do raciocínio, como tem feito sem perceber, porque, além da crosta que reveste seu cérebro de meias verdades, há todo um aparato especializado em turvar o ambiente que produziu um imenso cárcere privado, virtual, invisível mas dotado dos poderes da bruxaria cibernética.

Não sei se você terá suficiente disposição para parar e pensar. Nem que seja só por um instante.. Se você estiver disposto a resgatar seu cérebro, bem que poderá retomar sua capacidade de raciocínio. Não precisa mudar quanto ás as suas antigas concepções.

Mas precisa urgentemente balizar suas atitudes na busca do respeito que todos mereceremos. O pior que lhe acontece é abrir sua guarda ao primeiro sussurro que satisfaça seu momento emocional ou seu parco estoque de conhecimentos. Você (como eu) não é obrigado a rezar pela mesma cartilha por conta de uma determinada formação que engendrou suas convicções.

Cérebros travados

O tempo, mais do que ninguém, é a melhor fonte das lições. E o raciocínio é a arte mais apurada da percepção do legado de cada dia vivido.

No momento em que você abre mão de raciocinar trava todas as suas faculdades mentais. Torna-se um cidadão de cérebro terceirizado, facilmente manipulável.

Pior. Renuncia ao que o distingue dos demais animais - a inteligência. Abre mão do maior dos alimentos, o conhecimento. Nessa seqüência de recuos fatais, perde o juízo crítico. Vira um mero repetidor dos outros, principalmente dos que detêm os meios de comunicação de massa.

Vejo que isso está acontecendo em larga escala e em todas as camadas da sociedade humana. Os mais espertos dão as cartas e escravizam os que transferem a eles o direito de pensar e decidir.

Isso é alarmante como um grande vírus da inércia que se alastra celeremente por todos os seres humanos. Vou dar um exemplo: a sociedade democrática nunca existiu. Ela devia ser a expressão da vontade livre das grandes maiorias. E, no entanto, é a expressão mesquinha de uma ínfima minoria.

Não estou falando aqui da hegemonia de uma classe sobre outra. Quem o induz a aceitar a escravidão e a impostura é um bolsão de poucos controladores da mente humana.

Esse núcleo monitor apostou na ascensão da mediocridade e no primado da incompetência na gestão de Estado, obtendo a desfiguração dos poderes republicanos e abrindo caminho para os poderes paralelos, que são os verdadeiros senhores de todos os movimentos.

Conseguiu-se o mais trágico dos desvios - a abolição dos compromissos básicos no exercício dos poderes públicos; e aí não falo só dos que escolhemos pela via do equívoco. De um modo geral, os cidadãos que deixaram de raciocinar estão expostos a decisões ilegítimas, a manobras torpes, ao crescimento da capacidade de sedução obscena.

Qualquer um, que tenha uma fonte de poder, sente-se à vontade para passar por cima de tudo como um trator desgovernado e a sociedade que renunciou às suas prerrogativas críticas acaba aceitando como um fato consumado.

Isso acontece infelizmente porque você, como a maioria dos brasileiros, já não se vale dos elementos vitais, como o censo de observação, a atenção devida, o exercício da percepção, o patrimônio da memória, a essência do raciocínio, o juízo de valor, a faculdade da imaginação, o acervo do conhecimento, a força do pensamento e a expressão de sua própria compreensão dos fatos.

Não sei se você me entendeu hoje. Mas se você parar para pensar, como já referi, verá que tudo de ruim que possa acontecer a todos nós é responsabilidade imperdoável de cada um.

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segunda-feira, 5 de novembro de 2007

quinta-feira, 1 de novembro de 2007